quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Praça à cunha ontem em Alcochete e alguma desilusão com os tão esperados Romeros...

Muita expectativa e praça cheia por obra e graça da presença dos toiros
de Partido de Resina, antigos Pablo Romero. Mas depois... a montanha pariu
um rato...
Rouxinol, Bastinhas e Filipe: os protagonistas da nocturna de ontem em Alcochete
Maestro Bastinhas: quem sabe, triunfa!
Acabado de chegar de triunfal digressão à Ilha Graciosa, Rouxinol triunfou
ontem em Alcochete 
Afirmação e consagração de Filipe Gonçalves: a caminho de ser Figura!
Primeira pega do Grupo de Évora, a cargo de João Madeira, novo elemento
Manuel Rovisco Paes (Évora) - um forcado enorme!
A pega de João Salvação, cabo do Aposento do Barrete Verde
Valente e decidido, Diogo Amaro pegou à segunda


Miguel Alvarenga - Nem tudo o que luz é ouro e nem tudo o que é ouro... luz. Depois da emoção que se viveu no concurso de ganadarias ali realizado dias antes (domingo), a nocturna de ontem em Alcochete, segunda corrida das Festas do Barrete Verde e das Salinas, foi uma espécie de desilusão...
A praça encheu a "rebentar pelas costuras" - e, só isso, valeu a pena. Antes e depois da corrida, o ambiente era enorme e espantou até os dois casais espanhóis que se sentaram numa barreira mesmo à minha frente e que são os proprietários da ganadaria Partido de Resina. Nunca pensaram, como mais tarde confessaram, "dar com uma festa destas". De facto, Alcochete é uma "terra santa" onde a tauromaquia tem mesmo "outro sabor" e as festas do Barrete Verde são Portugal no seu melhor.
A praça encheu, dizia eu, muito principalmente pela presença dos toiros da ganadaria Partido de Resina, os "descendentes" da célebre e temida divisa de Pablo Romero. Contudo e como Bastinhas comentou ao empresário "Nené" no momento em que vinha à trincheira pegar mais um ferro, "afinal eles não comem ninguém...".
Bem apresentados, sobrou em trapio, em idade e em sentido, em seriedade também, o que depois faltou em bravura. Cinco toiros tinham a pelagem característica dos antigos Pablo Romeros. O primeiro foi manso e meio distraído; o segundo cresceu ao longo da lide e acabou por ser bom; o terceiro era mansote demais e procurava constantemente o refúgio em tábuas; o quarto não facilitou, mas foi muito inteligentemente lidado por Bastinhas; o quinto cumpriu sem alardes; e o sexto foi o "mais Pablo Romero" dos seis, provavelmente um bom toiro, dirão alguns. No contexto geral, os toiros não justificaram a expectativa que rodeou a sua vinda a terras de Portugal. Aos forcados não fizeram mal algum. Arrancaram-se quase sempre com alegria, foram direitos pelo seu caminho e não derrotaram. Tinham velocidade, apenas. Mas também tiveram pela frente dois belíssimos e bem experientes grupos, os Amadores de Évora e os do Aposento do Barrete Verde de Alcochete.
E se os toiros desiludiram, o mesmo não se pode dizer dos toureiros. Bastinhas e Rouxinol enfrentram os "Romeros" com a experiência e a técnica de quem já anda há muitos anos "a virar frangos". Filipe Gonçalves confirmou tudo o que dele se tem dito e escrito nas últimas temporadas: tem um percurso de luta e afirmação muito idêntico ao que viveu Luis Rouxinol nos seus inícios, está a afirmar-se e está a consagrar-se definitivamente entre os primeiros. Mercê do seu trabalho, do seu empenho, do seu sacrifício e do seu querer. Vai ser Figura e disso já ninguém tem dúvidas.
Joaquim Bastinhas pôs os ferros no primeiro da noite, que não passou de manso e andou sempre despegado e distraído na arena. Terminou com um par e foi, até ao intervalo, o único que cumpriu nesse sentido: em noite anunciada dos "reis das bandarilhas", Rouxinol e Filipe não colocaram pares nos seus primeiros toiros.
No quarto da noite, Bastinhas deu aquilo a que se chama uma lição de maestria e uma demonstração nata da sua muita experiência. Não deu ao toiro tempo para "pensar". Quando o animal "deu por isso", já tinha todos os ferros "em cima". Chama-se a isso saber. E o Maestro Bastinhas sabe mais a dormir que muitos acordados. Voltou a brilhar com um par empolgante e, como é seu hábito, galvanizou o público, deixando-o em euforia. Quem sabe, sabe.
Luis Rouxinol limitou-se a cumprir no seu primeiro, um toiro que foi "de menos a mais", que cresceu e que acabou por mandar na arena. Rouxinol andou ao seu estilo, sem variações nem oscilações, igual a si próprio. Brilhou sem atingir, contudo, o melhor a que nos vem habituando.
No quinto, teve uma actuação mais arrasadora, cravou grandes curtos e deixou a sua imagem de marca num enorme par de bandarilhas. Esteve brilhante na brega.
Filipe Gonçalves está num momento de afirmação que já começa a ser também de consagração. É, sem dúvidas, um dos grandes desta temporada e está por fim a conseguir conquistar, mercê do seu enorme mérito, uma posição entre os primeiros. Longe vão os tempos em que era, apenas e só, "o toureiro do Algarve". Libertou-se desse estigma, veio por aí acima e está hoje nos grandes cartéis e nas maiores competições sem nunca defraudar. É valente e é decidido. E repito: vai ser Figura.
Esteve diligente e fez o que pôde no seu primeiro, mansote. No último, o melhor toiro da noite ou, pelo menos, o "mais Pablo Romero" dos seis, impôs a sua raça, a sua vontade férrea de triunfar e conseguiu ter o público a seu lado. Foi uma lide reveladora da raça e da casta de um Toureiro bom. Terminou também com um valente par em terrenos de compromisso e a pôr a carninha toda no assador.
No campo da forcadagem, a rapaziada dos dois grupos - Évora e Barrete Verde de Alcochete - teve apenas que, com técnica e perfeição, "aguentar-se à bronca" com a velocidade dos toiros na investida. De resto, não fizeram mal nenhum, nem deram às pegas e aos forcados a emoção e o perigo a que todos assistimos dias antes no concurso de ganadarias. Foram seis pegas bem executadas, mas a que faltou o brilhantismo que dão os toiros "que batem". Estes não bateram em ninguém...
Por Évora, formação em grande forma, pegaram, todos à primeira, João Madeira e os consagrados João Pedro Oliveira e Manuel Rovisco Paes (que forcado enorme!) ao primeiro intento, este último em sorte brindada a Vasco Pinto, cabo dos Amadores de Alcochete e grande herói da corrida de domingo naquela mesma arena. Foi um brinde bonito e bem demonstrativo do espírito de solidariedade e amizade que une os forcados, independentemente das jaquetas e dos grupos a que pertencem.
Pelos Amadores do Aposento do Barrete Verde de Alcochete (que amanhã regressam à arena da sua terra) pegaram o cabo João Salvação (perfeito, à primeira), o valente Diogo Amaro (numa pega rija, à segunda) e Marcelo Lóia, à primeira.
Tiago Carvalho dirigiu com acerto a corrida e houve brindes de forcados e do cavaleiro Filipe Gonçalves à Banda de Alcochete - bem merecidos. O Aposento do Barrete Verde brindou uma pega ao matador Luis "Procuna", afastado das arenas por delicada doença.
Os toiros foram eficiente e rapidamente recolhidos a cavalos por duas parelhas de campinos e a corrida durou pouco mais de duas horas - um exemplo. Na brega, frente a toiros "que exigiam", um olé bem alto para João "Belmonte" e Ricardo Raimundo, David Antunes e Josué Salvado, Cláudio Miguel e Duarte Alegrete.
A noite valeu ainda pelo agradabilíssimo jantar, em extraordinária companhia, no bar mais afamado das festas, o do meu querido amigo António José Pinto; e pela festa do Alfoz que se seguiu à corrida, no Pateo Barceló, uma organização selecta do simpatiquíssimo Fernando Pessoa e uma belíssima paella... de chorar por mais!
Em Alcochete, a festa continua e tem amanhã a corrida de encerramento da Feira Taurina no derradeiro dia daquela que é uma das mais tradicionais festas de um Portugal que, apesar das Troikas & Companhias, teima - e resiste - em ser outra vez Portugal. As Festas do Barrete Verde são únicas! Vivam as boas gentes de Alcochete!

Fotos M. Alvarenga