Praça cheia. Quem disse que o público não ia ver corridas mistas?... |
Sete estampas os toiros de Ribeiro Telles. Triunfo da ganadaria! |
Mais uma lição de António Telles, depois da antológica lide de Lisboa! |
Lide enorme de João Telles no quinto toiro da corrida, com quase 700 quilos! |
Manos Telles na arena, ovação ao triunfo da ganadaria! |
O pegão do cabo Ricardo Castelo em tarde de grande êxito para os Amadores de Vila Franca de Xira, três pegas à primeira a toiros de verdade! |
António João Ferreira; decisão, ambição, a sede do triunfo (alcançado!) |
Nuno Casquinha: mérito, muito mérito, enorme valor |
Verdade e emoção: Joaquim Oliveira! |
Técnica e muito mérito: Rodolfo Barquinha! |
Arte e poderio: Cláudio Miguel! |
... e que pena continuar de portas fechadas o emblemático Restaurante "O Redondel"... que saudades! |
Miguel Alvarenga - Na manhã de ontem,
quando enviou à comunicação social os pesos (assustadores!) dos toiros de Mestre
David Ribeiro Telles para a corrida da tarde na "Palha Blanco", a
empresa "Tauroleve" prometera "um hino pleno ao Toiro
Bravo". E cumpriu. Mas ontem houve muitos mais hinos na arena de Vila
Franca. Um hino à arte de bem tourear a cavalo, entoado pelos Ribeiro Telles,
António e o sobrinho João. Um hino à arte de bem pegar toiros, cantado pelos
Amadores de Vila Franca. Um hino ao mérito de dois valorosos matadores de
toiros e ao futuro do toureio a pé. Um hino à arte de bandarilhar, temos os
melhores bandarilheiros do mundo. Um hino à garantia de que vamos continuar a
tê-los, entoado pelo jovem Filipe Gravito em tarde de brilhante alternativa. E
um hino à aficion de Vila Franca, um público que vibra e sente o toureio a pé e
que ontem encheu as bancadas da "Palha Blanco" como há muito as não
víamos cheias nestas tradicionais e tão portuguesas festas do Colete Encarnado
- um verdadeiro hino ao Campino e à lezíria, ao cavalo e ao toiro. A um outro
Portugal que teima e resiste em manter cultos e tradições centenárias. Por fim,
justiça para todos - um hino à seriedade, à dinâmica, ao empenho e à verdade de
uma empresa, a "Tauroleve", de uma Família, pai Augusto e filhos
Ricardo e Rui Levesinho, que com muito esforço e uma determinada dedicação,
lograram por fim restituir o brilho, o carisma e a mítica da praça de Vila
Franca.
A corrida de ontem foi daquelas que deixam
história, que fazem aficionados e que "apetece ver outra vez". Os
toiros, toiros de verdade, de Mestre David, deram emoção, trouxeram perigo,
imponentes, verdadeiras estampas, astifinos os lidados a pé, toiros impróprios,
diga-se em abono da verdade, para matadores, sem a sorte de varas. António João
Ferreira e Nuno Casquinha e os bandarilheiros que cumpriram com inegável brio e
imenso pundonor, muita arte e invejável valentia, os tércios de bandarilhas,
tiveram o mérito de estar ali diante de toiros que provocam calafrios nas
bancadas, suscitam suspiros de ansiedade e devolvem à Festa a emoção, o perigo
e a verdade que tão arredados têm andado.
O que ontem ali aconteceu foi o regresso
da verdade e da essência pura do que deve ser uma corrida de toiros. Tal como
na quinta-feira com os Grave em Lisboa, houve outra vez toiros à antiga na "Palha
Blanco". O que ali todos vivemos ontem foi o espírito autêntico e sem
"martingalas" da corrida de toiros, tão adulterada nos últimos anos
por obra e graça dos toirecos da corda, da ausência de perigo, da escassez de
emoção. Assim, sim. Assim, vale a pena ser aficionado. São empresas, toiros,
toureiros e forcados como estes que podem devolver à Festa o seu carisma, o seu
glamour e a sua emblemática emoção. Aos poucos, tudo isso tem vindo a ser
recuperado. Já era tempo de pôr um travão aos toirinhos fáceis, aos toureiros
que querem toiros para brincar e não para tourear. Um olé bem alto a Vila
Franca, à empresa dos Levesinho e aos toureiros e forcados, aos ganadeiros, que
ontem contribuiram para recuperarmos todos os sentimentos que andavam
adormecidos, perdidos, escamoteados e deturpados numa assustadora facilidade,
numa gritante falta de emoção. Assim, sim. Assim, vale a pena voltar a ser
aficionado!
E creio que disse tudo. Mas mesmo assim,
vou lembrar mais algumas coisas. Os Telles abriram a corrida a duo e apesar de
as lides a dois não serem propriamente a forma desejável de se ver o toureio a
cavalo, a verdade é que tio e sobrinho imprimiram ritmo e dinâmica, tiveram
música e o espectáculo resultou.
Nos toiros a sós, esteve enorme António,
repetindo o triunfo de Lisboa, reafirmando que este é o seu melhor ano,
ensinando, outra vez, como se toureia de verdade a cavalo, coisa única, momento
fantástico, público de pé, arte, arte e mais arte. Valor. Carisma. Um Mestre.
Respondeu João ao tio com uma lide
magistral, frente a um toiro imponente com quase 700 quilos e que veio acima de
ferro a ferro. O jovem Telles cresceu, impôs a sua raça, entrou pelo toiro
dentro, cravou ferros de antologia. Tarde inspirada, glória na Vila Franca que
é deles, já dizia o saudoso Bacatum que os Telles estão para Vila Franca como
Curro Romero para Sevilha e a profecia continua a cumprir-se.
Grandes, grandes, os Forcados de Vila
Franca. Com toiros de verdade e de emoção, houve grandeza, senhorio, toureria e
a usual valentia na nobre arte de pegar toiros, sempre tão bem representada
pelos Amadores de Vila Franca. Foram ontem forcados de cara, todos à primeira,
Rui Godinho, o cabo Ricardo Castelo e o veterano Ricardo Patusco, que fez um
pegão, mas infelizmente saíu lesionado numa perna. O grupo esteve enorme nas
ajudas. Como sempre.
Agora o toureio a pé.
O toureio a pé está vivo, tem valores e,
mais importante que isso, tem futuro em Portugal. É preciso é ter cabeça, saber
fazer, saber montar cartéis, ter rigor e eficácia ao assumi-lo. E é preciso,
primeiro que tudo, saber onde se podem montar corridas com matadores. A corrida
mista era a corrida-modelo nos anos 60 e 70. Depois foi abafada pelo grito dos
novos cavaleiros, pela fase de euforia que nasceu da revolução mourista e dos
que a seguiram, no final da década de 70. Mas a verdade, que alguns não querem
ver (os empresários, sobretudo), é que o toureio a pé tem público. Mas tem-no
apenas e só em algumas praças. Lisboa, Vila Franca e Moita serão as três
principais. E é por aqui que pode renascer de novo a paixão pelos matadores.
Não esqueçam isso, não entrem noutras aventuras desajustadas. Quem te avisa,
teu amigo é.
Ontem na "Palha Blanco", o
público viveu emoções de outros tempos com a actuação dos toureiros a pé,
repito, dos matadores e dos valorosos bandarilheiros. O público não arredou pé,
não saíu da praça quando terminaram de actuar os cavaleiros, ficou até ao fim e
ainda bem que ficou, que a última faena de Nuno Casquinha, ao menos bom e mais
"manhoso" dos toiros, com 595 quilos (credo!), uma montanha de
perigo, ainda para mais sem picadores, foi um grito de valor e de afirmação, um
grito de mérito de um jovem matador que em boa hora regressou ao nosso país,
depois de ter estado uns anos radicado no Perú. Foi um hino de garra, de
valentia, de raça e de ambição. Esteve Casquinha valente como os heróis, deu a
cara, impôs-se, disse bem alto: "Estou aqui!".
Se já estivera um "toureirazo"
no seu primeiro toiro (515 quilos), no segundo esteve enorme, importante, a
provar tudo aquilo que escrevi antes: o toureio a pé tem valores e tem futuro
entre nós.
A mesma mensagem deixou-a António João
Ferreira nos dois toirões que enfrentou, com 515 e 585 quilos, respectivamente, astifinos, com perigo.
Imenso mérito, grande afirmação, determinação e arte, com uma dose incrível de
valor.
À imponência e à violência dos toiros,
respondeu Ferreira com a estática impressionante da sua franzina figura, pés
parados, coração de gigante, "aqui estou", disse também e depois
abriu o livro, desenrolou experiência e técnica, parecia ele um toureiro muito
toureado, cheio de ofício, de entrega, de vontade - e também de ambição.
Colhido quando entrou "a
matar" o seu primeiro, depressa se levantou e mesmo magoado (sofreu um
corte num dedo), de pé se voltou a pôr, destemido, num desplante de ousadia e
de garbo. Recolheu à enfermaria depois de dar aplaudida volta à arena. E
voltou. Voltou para triunfar no sexto da ordem, de novo se agigantou e se
impôs, como que a dizer, insisto, não me canso de insistir: o toureio a pé tem
futuro em Portugal! Assim acreditem as empresas, assim haja eficiência e rigor
na montagem das corridas com matadores. Nos sítios certos, repito.
Tarde de louvor e de triunfo para os
toureiros de prata. Enormes, evidenciando poderio, arte e valor com as
bandarilhas, estiveram Joaquim Oliveira e Rodolfo Barquinha no segundo toiro da
tarde, Manuel dos Santos "Becas" e Filipe Gravito no terceiro, tendo
este último recebido a alternativa em tarde que há-de recordar para sempre.
Comoveu-se, agradeceu a mais calorosa das ovações, esteve grande o jovem
toureiro de Salvaterra, que pertence à quadrilha da cavaleira Ana Batista, mas
que ontem disse que pode, e deve, ombrear com os melhores em corridas a pé.
No sexto toiro, voltou a brilhar
Barquinha (enorme!) e o pequeno-grande Cláudio Miguel (extaordinário), que
muito merecidamente se demonteraram para agradecer as justas ovações de um
público que lhes reconheceu o mérito de terem feito o que fizeram e terem
brilhado como bilharam diante de toiros que podem matar. Mérito, imenso mérito.
Dois grandes toureiros.
O último toiro foi bandarilhado
exclusivamente por Manuel dos Santos "Becas", face à ineficácia do
outro interveniente.
Excelente intervenção, também, nas lides
a cavalo, dos bandarilheiros (peões de brega) Ernesto Manuel, João Ribeiro
"Curro", Nuno Oliveira, João Curto e António Telles Bastos.
Uma palavra final para o triunfo da
ganadaria Ribeiro Telles. Sete toiros magníficos, exceptuando o último, que
justificaram os aplausos permanentes do público, quer à saída, quer na hora da
recolha e também a chamada à arena, no quarto, dos irmãos João e Manuel Ribeiro
Telles, representantes da divisa de seu Pai, Mestre David.
Em corrida e festa de louvor ao Campino
(muitos nas bancadas, como sempre, brindados até pela forcadagem), um aplauso
ao labor e à eficiência dos campinos "Café" e "Janica". Deram aplaudida volta à arena no quinto toiro com João Telles.
Mais de três quartos de casa, praça
cheia, em corrida muito bem dirigida, como sempre, por Manuel Gama, com o rigor
e a aficion que caracterizam um dos melhores directores de corrida do momento,
ontem assessorado pela médica veterinária Drª Francisca Claudino.
Ao início da função guardou-se um minuto
de silêncio em memória do Maestro José Falcão, vítima de colhida mortal em
Barcelona há 40 anos (Agosto de 1974) e a Câmara e a Misericória de Vila Franca,
proprietária da praça, prestou-lhe homenagem com a presença na arena de seu irmão,
Osvaldo Falcão, a quem depois também brindaram as suas lides os matadores.
Tarde grande, uma corrida para recordar.
Valeu a pena!
Não perca hoje, aqui no
"Farpas", a fotoreportagem de Emílio de Jesus: os Momentos de Glória,
a colhida de António João Fereira, a brilhante alternativa de Filipe Gravito, a
verdade com que ontem se toureou e bandarilhou em Vila Franca - e os Famosos
que por lá estiveram.
Fotos M. Alvarenga