segunda-feira, 10 de julho de 2017

Puta de vida, Zé!


Miguel Alvarenga - Ó , apetecia-me escrever tanta coisa e acredita que não consigo. Foram tantas histórias, foi tanta vida, foi tanto riso - e agora, nada. Muita gente não sabia, nem tinha que saber, a nossa Amizade, mesmo com A grande, tinha para aí 40 anos, desde os tempos do Colégio Valsassina. Eras um nadinha mais velho que eu, embora uma vez me tenhas perguntado se não tínhamos a mesma idade, não, , eu sou da idade do teu irmão Jorge, lembro-me de vocês todos no Colégio, de ti, do Chinita, do António, do Jorge
O casaco castanho claro de camurça era a tua imagem de marca e eu dizia sempre por graça, quando vestia o meu, “olha, hoje trago um casaquinho à Zé Palha”. E tu rias. Queria-me lembrar de tanta coisa e só sinto saudades e tristeza e um vazio grande. Acho que ainda ninguém acredita, .
Puta de vida. Foi valente e corajosa a forma como encaraste nos últimos anos a tua nova situação numa cadeira de rodas. Mas estavas em todo o lado. Com um cigarrinho, com um sorriso, com aquele humor e aquela graça. Não faltavas a uma corrida, não perdias uma Feira da Golegã. Eras um pouco a imagem disso tudo. Eras Festa, eras Golegã, eras um pouco de todos nós e eras um Amigo daqueles que se não esquecem mais, , daqueles puros e verdadeiros, sinceros, genuínos. Que fazem falta e dá gosto ter tido.
Lembras-te quando fomos com o Rafael Vilhais e o Vasquinho Taborda a La Puebla del Rio a casa do Diego Ventura no dia de anos do nosso querido Palhinha? Rimos para cá e para lá, foi tão divertido e eu não esqueci mais. Lembras-te dos tempos do Valsassina, das conversas de toiros e cavalos, o que eu aprendi contigo? Lembras-te daquele almoço em Nimes no dia da alternativa do Mourinha, dos copos que bebemos no bar do Hotel Vitória sempre que em Madrid toureava o João Moura e tu nunca faltavas? Lembras-te dos telefonemas, da força que me deste quando passei aqueles fins-de-semana no Linhó?
Que merda de vida, . Tinhas 65 anos, acho que eram 65, mas a nossa mentalidade era a eterna dos 15. Havia ainda tanto para fazer, para rir e para estarmos juntos. Falei há bocado com o Carlinhos Empis e acredita que chorei quando desliguei o telefone e me passaram pela cabeça tantas imagens juntas, umas atrás das outras, das vezes em que estivemos juntos, mas sobretudo das vezes em que te encontrava nesse quarteto de amigos inseparáveis que formavas sempre com o Empis, com o Emídio e com o Paim. O Cortesão até escreveu uma vez no “Farpas” uma crónica lindíssima sobre o que vocês representavam e o que vocês eram como exemplo da Amizade e património dessa festa única que é a Feira da Golegã.
Agora, de repente, não te vou ver mais, , não me vou rir mais com as tuas graças, não vou poder abraçar-te mais nas praças de toiros. Porquê, ? Porque é que a vida é assim? Que coisa tão estúpida, que coisa tão sem lógica…
Os Amigos não morrem nunca. Eu sei. Eu quero acreditar nisso. Mas não consigo, .
Um beijo grande. Fica em paz. Olha por nós. Diverte-te quando nos vires. Deixaste-nos. Mas nós todos nunca te vamos deixar. Nunca, mesmo, .

Foto Emílio de Jesus